Ultimato do Bacon

Wilson de Daniel Clowes (2010) – O Ultimato

Em 8 de Nov de 2022 4 minutos de leitura
Wilson de Daniel Clowes (2011) – O Ultimato

Wilson de Daniel Clowes (2010) foi o primeiro quadrinho de Daniel Clowes a ser lançado diretamente como novela gráfica, publicado pela editora canadense Drawn & Quarterly. Outros sucessos do autor, incluindo Como Uma Luva de Veludo Moldada em Ferro (1993) e Ghost World (1997), saíram primeiro serializados na revista Eightball.

Curiosamente, Wilson foi produzido por meio de tiras de uma página que funcionam individualmente, sempre com desfecho irônico ou de humor. A arte de Clowes muda de tira para tira. Embora sempre reconhecível, às vezes bem cartunescas ou caricatas, outras mais realistas. No todo, temos a história de Wilson, senhor com 40 anos passados de comportamento misantropo e pitoresco.

No Brasil, o quadrinho foi publicado pela Quadrinhos na Cia. – selo da Cia. Das Letras – em 2012, 80 páginas coloridas e capa cartonada. Infelizmente, não é dos gibis mais fáceis de encontrar, mas é possível comprá-lo em sebos e semelhantes.

Qual a trama de Wilson de Daniel Clowes

A quarta capa da edição brasileira define Wilson como “adorável malandro, solteiro solitário, pai e marido dedicado, idiota, sociopata, fanfarrão desiludido e flor delicada.” Sim, ele tem de tudo isso.

No entanto, creio que uma forma melhor de o resumir seria como sujeito de meia idade que fala o que bem quer sem se importar com as consequências ou com quem está ouvindo. Sincericida, direto e muitas vezes babaca. Justamente por isso acaba sendo cômico.

Wilson de Daniel Clowes (2013) – O Ultimato

As tiras iniciais são mais para nos apresentar essas características do protagonista do que para inserir-nos em um enredo. Acompanhamos suas reflexões existencialistas e conclusões desagradáveis, além do contato com outras pessoas. Isso é feito inclusive com aquelas que não querem socializar, como um desconhecido trabalhando com o notebook na lanchonete ou um qualquer no ônibus.

O cotidiano de Wilson inclui passear com sua cachorrinha Pepper – único ser vivo que recebe do protagonista amor incondicional –, caminhar, ler e ir a cafés em Oakland, Califórnia, onde mora. Ele nunca trabalhou e, aparentemente, vive de renda.

Logo descobre que o pai está em estado grave de saúde. Precisa viajar para Chicago e visitá-lo no hospital. É lá que, sozinho, Wilson começa a buscar pela ex-mulher. Por um bizarro delírio, ele acredita que a personagem, Pippi, após o divórcio, passou a viver em um mundo de surras, drogas e prostituição – e não pensa duas vezes em falar para qualquer um –. É com uma garota de programa que ele se lembra que a ex estava grávida quando se separaram – sente o personagem! –.

Após mais de 15 anos, Wilson vai atrás de Pippi e da “criança”. Ele reencontra a mulher, que também parece ser uma figura igual e estranhamente polêmica, e a convence a encontrar a filha.

A sequência da história conta como foi esse reencontro, além dos desdobramentos que ele causará, incluindo prisão e sequestro, de forma que vamos acompanhando o envelhecer do protagonista em uma passagem de anos.

Ironicamente, quando Wilson se viu solitário, a busca por um vínculo afetivo que sempre negou é também o que resultará nas piores consequência para ele. Nos termos da editora brasileira, Wilson de Daniel Clowes é “parte saga familiar e parte tragicomédia de costumes.”

Vale a pena ler?

É incrível como Daniel Clowes consegue tornar um tipo de personagem que raramente aparece como protagonista de qualquer coisa blockbuster – um cara medíocre de 40 anos passados – em algo que nos prende a leitura e diverte. De fato, é uma criatividade que sempre nos leva por caminhos inusitados.

Wilson de Daniel Clowes (2012) – O Ultimato

Se tem algo que passa perto desse tipo de produção, talvez, sejam nomes como Woody Allen e Philip Roth. Me lembrei do cômico e insólito personagem de Descontruindo Harry (1997). Se você já assistiu, provavelmente perceberá em que momento no decorrer da leitura.

A evidência do protagonista como alter-ego do autor – mesmo quando não propositalmente –, personagens questionadores e em busca de autocompreensão, bem como a crítica irônica a determinados recortes da sociedade norte-americana, unem Clowes a nomes como os citados.

E Clowes consegue nos gerar sentimentos ambíguos. Chega a ser assombroso quando nos identificamos com Wilson. Acontece, por exemplo, quando ele solta alguma bomba, muitas vezes verdadeira – como no caso da hipocrisia de quem passa direto por um mendigo morrendo e acha um horror cachorros abandonados –. Fale a verdade, você nunca se segurou antes de dizer algo? Aí, Wilson parece no lugar ideal. O que você pensa, ele fala.

Nos discursos, em determinados momentos, Wilson até soa progressista, com críticas ferozes as elites ou ao uso de recursos naturais em demasia. O problema passa a existir quando ele critica tudo e todos com extrema e hipócrita acidez, como se fosse o senhor da verdade, nas horas mais inoportunas. Não é semelhante ao que vemos nos comentários da internet por aí afora?

Wilson gera mistura de empatia com sentimento de “só podia dar nisso”, “bem feito”. A passagem irregular do tempo e a variedade estilística ajudam a simbolizar questões psíquicas.

De acordo com Clowes em entrevista à Folha de S. Paulo, a ideia era representar a forma intermitente de nossas memórias e as mudanças de humor de um dia para outro. Tudo isso torna Wilson uma HQ muito interessante e, sim, humana.

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Wilson de Daniel Clowes (2010) – O Ultimato


Créditos:
Texto:David Horeglad – @hq_ano1
Imagens: Reprodução
Edição: Diego Brisse 
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