Celebrando 50 anos da banda que ajudou a tornar histórica, Martin Barre mostra que não está velho demais para o rock’n’roll
por Alexandre Baptista
A noite nem estava tão fria em Curitiba na última sexta-feira, 06 de março. Mas a programação no Tork’n’Roll iria sem dúvidas acabar com qualquer resquício das temperaturas mais cálidas.
Fachada do Tork'n'Roll em Curitiba.
Pra começo de conversa o Tork é, em si, um lugar muito interessante. Ponto de encontro de motociclistas, empresta muito da cultura de entretenimento americana, com uma decoração interna que imita uma pequena cidade daquelas ao largo da mítica Rota 66. Garagem, tabacaria com fumódromo, pub, praça de alimentação e casa de shows. Um espaço que, mesmo sem nenhuma atração especial, já vale a visita.
Vista interna da ilha-pub, restaurante e decorações do ambiente.
Só que na última sexta o lugar ainda receberia o icônico Martin Barre, guitarrista original do Jethro Tull, e sua banda, tocando grandes clássicos do grupo inglês – ainda que sem o líder Ian Anderson, que se apresenta em Curitiba em junho, no Teatro Positivo com a turnê The Prog Years.
A casa abriu às 18:00 como de costume e o combinado era de que a imprensa chegasse até as 22:00 – o show em si começaria somente à meia noite. Enquanto fazia alguns registros pelo local, já passados alguns minutos do horário combinado, notei uma movimentação no palco e fui surpreendido por uma dupla de abertura – que não estava anunciada anteriormente: Didley Duo.
Didley Duo
O curioso duo de Curitiba é composto por João Kolachinski na bateria e Breno Teixeira nas “cordas” – sim, porque no lugar de guitarra, Breno usa instrumentos de corda fabricados por ele mesmo como um cabo de vassoura acoplado em uma latinha das Meninas Superpoderosas; uma pá de construção com cordas e um captador; um cabo de rodo acoplado a uma esfregadeira metálica de tanque; um trecho de calha de latão, com cordas e uma garrafa vazia…
Didley Duo em ação: Breno Teixeira na pá e João Kolachinski na bateria esquentando a galera.
Mais curioso que a formação e os instrumentos foi o som extraído por Breno: um blues meio southern rock de calibre com uma levada bastante competente e empolgante para toda uma plateia que não esperava nem mesmo por shows de abertura. Antes mesmo que a primeira música terminasse, a frente do palco – salvo o espaço VIP, reservado e organizado com mesas – já estava cheio de gente curtindo o som empolgante dos caras.
Desculpa amigo… você entendeu mal. Eu não "troco" calha. Eu TOCO calha!
Setlist
Badass Boogie
The Cosmic Surfer
Na sequência, o palco recebeu a banda The Cosmic Surfer de Florianópolis. Composta por Gabriel Gontijo nos vocais e guitarra, Beto Janesch no baixo e vocais, Rafael Richard na guitarra base e William Lamar na bateria, a banda da Ilha da Magia apresentou seu trabalho autoral de maneira competente e bem ensaiado.
The Cosmic Surfer manteve a plateia para a chegada da atração principal.
Com um som abertamente inspirado no rock clássico de bandas como Creedence Clearwater Revival, Rolling Stones e até um pé na surf music dos Beach Boys, a banda não errou nenhuma nota, entregando um bom som, apesar de pouco inovador.
Setlist
Martin Barre Band (com Adam Wakeman e Dee Palmer)
Com a casa já pronta para a atração principal, os músicos da Martin Barre Band tomaram o proscênio, com Martin Barre na guitarra, Dan Crisp nos vocais e guitarra, Alan Thomson no baixo e Darby Todd na bateria; além disso a apresentação contou com a participação especial de Adam Wakeman (filho do lendário Rick Wakeman do YES e atual tecladista do Black Sabbath e Ozzy Osbourne) e Dee Palmer, membro original do Tull, nos teclados. Palmer entrou somente a partir da quarta canção, sem motivo aparente.
Celebrando 50 anos da banda que ajudou a consolidar, Barre estabeleceu a já esperada linha do tempo sonora, abrindo o espetáculo com A Song for Jeffrey, uma das últimas faixas do álbum de estreia do Jethro Tull, This Was, de 1968. A música foi apresentada em uma versão sem as gaitas e a flauta de Anderson, numa pegada de blues contemporâneo – ao estilo de Joe Bonamassa, digamos – surpreendendo positivamente.
"Foge galera… eles chegaram pra nos levar de volta pra casa!" – A legenda é zueira, mas esses caras são alienígenas de verdade.
Na sequência, My Sunday Feeling, faixa de abertura do mesmo álbum, seguida por Back to the Family, For a Thousand Mothers e Nothing is Easy do segundo álbum Stand Up (1969) marcaram a fase mais blues/hard rock dos anos iniciais do Jethro Tull.
To Cry You a Song marcou a presença do álbum Benefit (1970) no show, seguida por Hymn 43 – do álbum Aqualung (1971) que prenunciava a próxima e óbvia música: uma das mais conhecidas da banda, a faixa título.
Com um dos riffs de abertura mais reconhecíveis da história da música, Aqualung trouxe a casa abaixo. A competência inquestionável dos músicos da Martin Barre Band e seus convidados especiais deu um aspecto extremamente vibrante no arranjo do clássico; o desempenho vocal de Dan Crisp – que se esforçava para, inclusive, mimetizar o desempenho físico e facial de Anderson – entregava um tributo louvável e respeitoso ao legado do Jethro Tull.
Dan Crisp (esq.) e Martin Barre: ainda do álbum Aqualung, a música Locomotive Breath entraria no bis.
A cronologia, até então seguindo a ordem de lançamento dos álbuns, pulou o emblemático Thick as A Brick (1972) direto para War Child (1974), abrindo com a faixa título e Sealion, voltando em seguida para Crossed-Eye Mary do álbum Aqualung.
Por fim, Barre adentrou a área “prog” do show e do repertório da banda – minha favorita – com músicas dos álbuns Minstrel in the Gallery (1975), Songs from the Woods (1977), Heavy Horses (1978), voltando no tempo para tocar um trecho de Thick as a Brick e ignorando Too Old to Rock’n’Roll: Too Young to Die (1976), infelizmente.
Adam Wakeman (teclado) e Barre: o tecladista brilhou especialmente na execução das músicas da fase progressiva do Jethro Tull.
O show foi finalizado com A New Day Yesterday, do primeiro album – lembram que eu comparei a “nova versão” de A Song for Jeffrey com Joe Bonamassa? Adivinhem quem regravou A New Day Yesterday… – e Jump Start, do décimo sétimo álbum do Tull, Crest of a Knave (1987), vencedor de um Grammy e sucesso de crítica, especialmente em razão da maior presença das guitarras de Barre.
O bis já mencionado, com Locomotive Breath, sacramentou uma noite de celebração da história da música e uma das mais influentes e importantes bandas do rock de todos os tempos.
Para o público só isso importou. Se o nome Jethro Tull tem de fato um dono, a música em si e todo o seu real significado são na realidade do público, que segue celebrando o Tull e suas icônicas canções com a mesma empolgação e veneração, independentemente do número de integrantes originais que estejam na banda apresentando-as.
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