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As vantagens e os perigos do Snyder Cut

Em 10 de Jul de 2020 6 minutos de leitura
Easter Eggs da Liga da Justiça de Zack Snyder 

As vantagens e os perigos do Snyder Cut – confira uma reflexão a respeito da decisão recente da Warner em liberar o corte de Zack Snyder para o filme de Liga da Justiça (Justice League, 2017), algo que traz um ineditismo na indústria do cinema e que pode ter bons resultados… mas a que preço?

 

Quando Zack Snyder precisou se afastar da produção de Liga da Justiça, chegava ao fim a sua participação no chamado DCEU (o universo cinematográfico da DC Comics). O filme que iria juntar os principais personagens da editora, seria o quarto de Snyder como diretor — ele também teve participação em Mulher-Maravilha, dirigido por Patty Jenkins —, porém, com a sua substituição às pressas por Joss Whedon, sua visão para o longa acabou sendo dissolvida aos poucos.

Liga da Justiça seria a primeira parte de um complexo arco, unindo não apenas os heróis já apresentados até então, mas trazendo Darkseid, um dos mais importantes vilões da DC nos quadrinhos.

 

Darkseid em uma das imagens reveladas por Zack Snyder de seu corte para Liga da Justiça.

 

Seria também o filme responsável pelo retorno do Super-Homem (o que de fato aconteceu), além de mais inúmeros acontecimentos, que poderiam ficar perdidos na história das produções que nunca chegaram a ser concluídas — Hollywood coleciona incontáveis destas, que vão da cinebiografia nunca filmada de Napoleão por Stanley Kubrick, até outra adaptação da própria Liga da Justiça, que teria direção de Tim Burton, além de Nicolas Cage no papel do último filho de Krypton.

Mas a saída de Snyder mudou as perspectivas da produção, do DCEU e do próprio futuro dos heróis da DC no cinema. Com Joss Whedon no controle, apenas um quarto do que havia sido planejado originalmente chegou às telas e o filme acabou recebendo uma nova leitura.

 

Índice

As vantagens e os perigos do Snyder Cut – o plot twist

Porém, em uma reviravolta (não tão imprevista, embora improvável), Snyder conseguiu fechar um acordo com a Warner Bros., para finalizar seu filme e lançar o chamado Snyder Cut, diretamente no recém-chegado serviço de streaming do estúdio, o HBO Max. Atualmente o diretor está trabalhando na pós-produção, para a qual deve contar com, no mínimo, US$ 20 milhões — o presidente da WarnerMedia e chefe da HBO Max, Bob Greenblatt, afirmou que dificilmente essa pós-produção não ultrapassará os US$ 30 milhões.

Toda essa novela gera algumas discussões. Antes de mais nada, é importante lembrar que a saída de Snyder de Liga da Justiça, inicialmente estava associada com uma tragédia familiar. Alguns meses depois, a história ganhou novos desdobramentos, porém, vale destacar que independente do motivo, uma segunda chance como esta é algo inédito, e é isto que será levado em consideração a partir deste ponto.

Existem inúmeros motivos que tornam todo esse desdobramento mais complexo do que apenas uma segunda chance. Em um primeiro momento, a possibilidade de um realizador concluir seu trabalho, pode soar positiva.

Por outro lado, demissões ao longo de uma produção são frequentes, seja por diferenças criativas, por conta da postura dos diretores, ou por alguma tragédia. O diretor ou a diretora que assumem a função de substituir, tem a função de concluir uma obra artística. É natural que existam diferenças entre a maneira como o filme foi planejado para ser, e a versão final, vinda de outra pessoa, com outras experiências e visões de mundo*.

O caso do Snyder, pode ser interpretado como uma negação completa do filme que chegou aos cinemas, e que também era a visão de um artista sobre um roteiro.

Ao mesmo tempo, Snyder saiu da produção com cerca de 80% dela concluída, e teve apenas 25% disso levado à telona. Ver seu trabalho sendo colocado de lado, para um diretor que já havia dedicado um tempo considerável de sua vida a uma franquia, pode gerar, no mínimo, um incômodo.

Vale destacar que a diferença entre o que Snyder filmou e o que chegou à versão final é a produção de um diretor que desempenhou um grande papel na construção de um universo cinematográfico. Isso afeta, além dele (e da participação dos atores, da equipe técnica e do próprio estúdio), o envolvimento dos fãs, que ansiavam por uma conclusão (ou algo próximo a isso).

 

As vantagens e os perigos do Snyder Cut – o fandom

Desprezados em diversas análises, o papel dos fãs na arte é tão fundamental quanto à do próprio artista (ou a daqueles que o financiam), afinal, sem o público, a arte apenas é. Ela não assume um papel social, artístico ou de entretenimento.

Assim, o Snyder Cut representa, também, uma tentativa de encerramento para um arco que nasceu em 2013, com o lançamento de O Homem de Aço. É uma trajetória de quase 10 anos, que poderá ser concluída, como o autor a concebeu originalmente (e o que seria das grandes obras, caso não tivessem sido concluídas? — embora ainda seja cedo para saber o quão grandioso será o encerramento deste arco).

Mas, como toda a discussão que não possui conclusão, existem outras perspectivas, ainda mais complicadas nesta história toda. No dia que a notícia sobre o Snyder Cut foi confirmada, a diretora Lexi Alexander – Hooligans (Green Street, 2005) e O Justiceiro: Em Zona de Guerra (The Punisher: War Zone, 2008) – escreveu a seguinte mensagem em sua conta no Twitter:

 

“Eu poderia fazer 4 ‘Hooligans’ com esse dinheiro. Eu gosto do Zack. Eu estou bem com o fato dele receber 20 milhões apenas para produzir a sua versão [de Liga da Justiça]. Só estou dizendo que, se houver outros 20 milhões voando por aí, posso fazer 4 filmes originais com isso. Não é sobre ganhar e perder. Isso nunca foi”.

A fala de Alexander levanta outros questionamentos importantes nesta discussão. Ela serve como o ponto de partida para um debate que possivelmente nunca terá uma conclusão.

Afinal, todos os anos, existem um bom número de produções, com orçamentos elevados, bancados por grandes estúdios e entregues para grandes diretores, trabalharem em filmes de grandes franquias. Star Wars, Vingadores, Jurassic Park, Velozes e Furiosos, 007 entre tantas outras, cujos orçamentos poderiam financiar filmes de novos diretores negros, mulheres, trans etc.

 

Daniel Kaluuya em cena de Corra! – orçamento 50 vezes menor que o de Vingadores do Marvel Studios.

 

Apenas para comparação, com o orçamento estimado de Vingadores, também dirigido por Joss Whedon e lançado em 2012, seria possível produzir quase 50 filmes como Corra! (Get Out), de 2017 e com direção do então estreante Jordan Peele. Novamente, a discussão aqui não é sobre a qualidade dos filmes, mas sobre as oportunidades que as produções gigantescas podem eliminar. Principalmente em um caso como o de Liga da Justiça, um filme já apresentado ao público, mesmo que não em sua versão original.

 

As vantagens e os perigos do Snyder Cut – e se flopar de novo?

E toda essa discussão ainda depende de um fator decisivo: o sucesso ou não da versão de Zack Snyder de Liga da Justiça. Embora haja um forte clamor dos fãs pela sua obra, nada garante que ela de fato seja melhor que a versão finalizada por Whedon e que chegou aos cinemas.

No caso de uma obra aquém do potencial do material original, possivelmente este caso ficará marcado como um evento único na história do cinema, que no futuro apenas servirá de material para estudiosos da área.

Porém, há um segundo caso. Aquele que sustenta toda esta discussão: e se o filme realmente fizer sucesso? Isso poderia abrir portas para que outros diretores reivindiquem suas produções, conforme originalmente foram concebidas.

David Ayer se antecipou, e foi o primeiro a se manifestar sobre isso. Ele alegou que a versão que foi aos cinemas de Esquadrão Suicida é considerável e consistentemente diferente do que ele havia planejado e gravado.

David Ayer sugere que também tem um corte de seu filme no Twitter.

 

O filme começou com uma campanha de marketing sugerindo um filme, que foi transformado nos meses seguintes, com trailers que apresentavam outro filme. Embora não seja possível saber o que teríamos na versão original do longa, é fato que muito se perdeu em batalhas de bastidores, e um novo filme foi criado às pressas. O resultado foi um dos maiores fracassos da Warner, com uma avaliação fraca dos críticos e dos fãs, embora a bilheteria não indique isso.

Quantos milhões de dólares a mais seriam gastos para finalizar a versão do diretor e colocá-lo para ser exibido em uma sala de cinema ou em um serviço de streaming? Quantos filmes novos, com histórias inéditas poderíamos perder, para que um filme fosse finalizado como seu diretor originalmente o concebeu?

Se você estava com esperanças de obter alguma conclusão por aqui, sinto por lhe frustrar.

Existe um debate político muito intenso nos bastidores do cinema, que vão além de qualquer conclusão. Apenas como uma nota adicional, para um filme com orçamento acima dos US$ 100 milhões, é esperado um retorno na bilheteria, de pelo menos, cinco vezes este valor (a conta é ainda mais complexa, pois existem custos de marketing e divulgação).

Porém, o sucesso deste filme pode representar o financiamento de diversos filmes menores. A economia do cinema não é simples, e o caso do Snyder Cut é apenas mais uma engrenagem de uma máquina muito maior do que um ou dois filmes.

 


Créditos e Notas:

Texto: Robinson Samulak

Imagens: Reprodução

Edição: Alexandre Baptista

*Este texto foi escrito antes de Ray Fisher, ator responsável pelo papel do Cyborg em Liga da Justiça, relatar problemas com Joss Whedon durante a produção. O comportamento abusivo do diretor, além de condenável, também afeta no resultado final, tanto da discussão sobre respeitar a sua versão do filme, como no que era esperado da produção.

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