Ultimato do Bacon

Nunca deu pra comprar gibi com o troco do pão

Em 12 de Ago de 2020 4 minutos de leitura
Banca de jornal e o preço alto das HQs

O preço alto das HQs é um dos maiores problemas de leitores e colecionadores no Brasil. Será? Confira esta matéria de opinião de Rômulo Miranda.


Quantas vezes, em um grupo de fãs de quadrinhos, já não surgiram conversas de “As novas gerações não lêem quadrinhos como as gerações liam antigamente”?

Quantas vezes a resposta apontada não foi o preço alto das revistas de hoje em dia?

Bom, acredito que não é bem por aí. Não é o preço que tem afastado novos leitores dos quadrinhos, e sim, vários outros fatores, incluindo a postura de muitos dos fãs mais antigos.

Hoje em dia as pessoas estão lendo cada vez menos de uma maneira geral… A internet (sim, essa mesma que você está utilizando agora pra ler essa matéria), apesar de facilitar o acesso a informação, tem afastado cada vez mais as pessoas das leituras tradicionais (principalmente as novas gerações).

Atualmente, se uma pessoa quer fazer uma receita de bolo, por exemplo, ela acessa o YouTube e assiste um vídeo de tutorial ao invés de comprar aqueles livrinhos com umas 50 receitas de bolos que são/eram vendidos em bancas de jornal.

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Outro exemplo é quando uma pessoa quer saber o que está acontecendo no mundo. Ela acessa algum site de notícias, e dá uma lida nos títulos das matérias e, às vezes, lê o conteúdo apenas daquelas que chamam mais atenção dela, ao invés de comprar o jornal, isso quando não abre um vídeo e o assiste ao invés de ler.

Não faltam exemplos.

Outra coisa que desestimula novos leitores é parte do próprio público mais antigo, que se acha melhor que a molecada nova só por que já leu 20 anos, ou mais, de HQs.

E quando vê alguém novo nesse mundo já quer falar que na época dele era melhor… que a pessoa não conhece nada… que ele não é fã de verdade por que não sabe que o nome do meio do Peter Parker é Benjamin… que não sabe dizer que a primeira aparição do Batman foi na revista Detective Comics #27 de maio de 1939 etc.

Quem vai se sentir estimulado pra ler assim?

Sem novos consumidores, o mercado vai quebrar em algum momento. Uma hora os antigos consumidores vão parar de consumir, pois estarão velhos demais pra isso. Não que as pessoas tenham que parar de ler quadrinhos em determinada idade, mas uma hora essa geração vai morrer literalmente ou vão ter que escolher entre comprar HQs ou remédios.

É sempre importante incentivar novas gerações pra manter o mercado vivo.

O preço alto das HQsVoltando para a questão de valores

O último formatinho do Superman (ou Super-Homem, como ele era chamado aqui no Brasil, na época) antes da fase dos Super-Herois Premium da editora Abril saiu em julho de 2000 e custou R$3,50:

A edição em questão continha 4 histórias distribuídas por 100 páginas e por ser formatinho possuía 13,5cm x 20,5cm, ou seja, 276,75cm² por página de papel jornal.

Convertendo os R$ 3,50 daquela época para valores de hoje (segundo o índice IGP-M) vamos chegar ao exato valor de  R$ 12,63.

Procurando nas revistas mensais da editora Panini, atual detentora dos direitos de publicação da mesma DC Comics no Brasil, encontramos uma mensal que é bem similar em questão de conteúdo:

  • A revista mensal Lanternas Verdes, que também possui 4 histórias, e apesar de não ter 100 páginas, chega bem perto com 92 páginas. Essas mesmas 92 páginas são de papel LWC em formato americano, 17cm x 26cm, ou seja… 44cm²:

Resumindo… a diferença monetária entre as duas revistas não é tão grande. E se levarmos ainda em consideração a mudança de formato e material das duas, me arrisco até a dizer que o preço alto das HQs atuais é ilusão. Elas estão até mais baratas ou no mínimo equivalentes.

Além de usar o índice IGP-M, vamos utilizar outra forma de comparação, o percentual do salário mínimo necessário para comprar cada revista em sua respectiva época.

Vamos lá…

No já um pouco distante ano 2000 (sim, ele está distante… quem nasceu naquele ano já é , ou será, maior de idade, com direito a ter uma carteira de motorista e voto, desde 2 anos atrás) o valor do salário mínimo era de apenas R$ 151,00. Para comprar aquela mensal do Super-Homem era necessário desembolsar aproximadamente 2,32% da renda mensal mínima, denotando o preço alto das HQs da época.

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Trazendo esse percentual de 2,32% para o salário mínimo de hoje*, R$954,00, teríamos algo em torno de R$22,13. Você precisa gastar isso para comprar uma mensal de quatro histórias? A resposta é “não”.

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Agora, vamos ver quantos por cento do salário mínimo é preciso para adquirir uma mensal de 4 histórias, com praticamente as 100 páginas: Como a Panini cobra R$14,00 pela mensal que estamos usando como comparativo e o valor atual do salário é R$954,00 desde janeiro de 2018, então quer dizer que gastamos um pouco menos do que 1,47%.

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Ou seja, no ano 2000 era necessário gastar 2,32% do salário mínimo para comprar uma revista mensal de 4 histórias, 100 páginas, em formatinho (276,75cm² em cada página) e em papel jornal.

Agora, 18 anos depois, desembolsamos 1,47% do salário mínimo pra comprar uma revista mensal em formato americano (44cm² por página) com papel mais luxuoso e com praticamente a mesma quantidade de paginas.

Pois é. Na proporção, comparando com o salário mínimo do ano 2000, hoje as HQs mensais estão até mais baratas, mesmo gastando mais material para confeccioná-las e com materiais de qualidade e durabilidade maior.

É doideira isso, eu sei… também sinto o preço alto das HQs e que as HQs estão mais caras quando olho pro valor impresso na capa, mas colocando na ponta do lápis e fazendo as contas, não estão.

É que nossa mente compara apenas o valor de capa daquela época com o das capas de hoje e não faz conversão de nada.

Não é o preço alto das HQs que tem afastado as novas gerações dos quadrinhos.

Nunca deu pra comprar gibi com o troco do pão. Nem antigamente e nem hoje.

 

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Créditos e Notas:

Texto: Rômulo Miranda

Imagens: Reprodução
Edição: Alexandre Baptista

Matéria originalmente publicada em 02 de abril de 2018. Atualizada em 12 de agosto de 2020.
*calculo realizado em 02 de abril de 2018, baseado no valor do salário-mínimo da data original da matéria.
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