Ultimato do Bacon

Kingdom 1ª e 2ª Temporadas (Netflix) – O Ultimato

Em 8 de Jun de 2022 4 minutos de leitura
Kingdom (01)

Caso você hoje curta obras audiovisuais e impressas relacionadas a zumbis, agradeça a George A. Romero. O pai dos desmortos é referência fácil no gênero terror e responsável por uma mania mundial presente em todos os lugares, da série The Walking Dead aos passinhos coreografados de Michael Jackson em Thriller, passando por Resident Evil, Game of Thrones e, por fim, Kingdom. A gênese e o conceito de mortos ambulantes comedores de gente foi criado originalmente por Romero em 1968 com o filme A Noite dos Mortos-Vivos.

Não fosse o bastante para garantir sustos e arrepios, o cineasta foi além e acrescentou crítica em sua obra ao pegar estes seres rastejantes, outrora um amontoado de membros costurados trazido de volta a vida ou fruto de vodu, e colocou-os como analogia da própria humanidade com seus medos, ansiedades, tensões e conflitos.

Portanto, terror também é cultura! E a série sul-coreana Kingdom, da Netflix, é um bom exemplo de material que bebe dessa fonte inesgotável de horror, medo e questões político-sociais numa ambientação de época marcada por boas atuações, belos figurinos e fotografia.

Índice

Uma Praga No Meio Do Caminho

Inspirado no manhwa (nome dado aos quadrinhos produzidos na Coréia do Sul) The Kingdom of The Gods, de Eun-hee Kim, Kingdom é uma série que remonta a época da Dinastia Joseon, entre 1392 a 1897, sendo a última dinastia coreana com ideais confucionistas que perdurou mais tempo – sistema filosófico criado por Confúcio em que eram trabalhadas questões relativas a moral, política, pedagogia e religião.

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The Kingdom of The Gods, o manhwa que inspirou a série televisiva Kingdom, da Netflix

Promissora e interessante, a série faz um recorte histórico e contextualizado da Coréia medieval para narrar a jornada do príncipe herdeiro Lee Chang (Ju Ji-hoon) que, junto ao seu guarda-costas Mu-yeong (Kim Sang-ho), parte numa missão para investigar uma praga que ameaça o reino.

Uma infecção que contamina toda população e transforma os humanos numa frenética convulsão de desmortos – ou monstros, como são chamados – sedentos por sangue e carne humana, voltam à vida por meio da rara planta da ressurreição, uma flor com propriedades medicinais e regenerativas (além de outros mistérios, falar mais pode estragar as surpresas que a série reserva).

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A jornada do herói relutante: o príncipe herdeiro Lee Chang não deseja o trono, porém, terá que lutar pelo reino de Joseon e salvar o povo de uma praga zumbi

Em sua missão de fazer uma revolução no país, marcado pela guerra,  fome e miséria, Chang pretende acabar com a fome e a doença que estão castigando o povo e, assim, construir um novo mundo.

É o proto-herói do qual Joseph Campbell fala a respeito em seu livro O Homem de Mil Faces (1949), alguém que se aventura pelo desconhecido para adquirir sabedoria, coragem e lutar pela paz em seu reino.

O príncipe herdeiro tem vários desafios de ordem política e escatológica durante sua jornada, ombreado por outros personagens que enriquecem a produção de Kingdom.

Ética e Moral Corrompidas

A humanidade, também denominada Ren no raciocínio confucionista, envolve filosofia, ética social, ideologia política e modo de vida. Na série, estes e outros valores (honra, respeito e gratidão) são trabalhados em cada personagem, desenvolvendo aspectos que os tornam relevantes para a trama.

Essa carga dramática não passa despercebida pelo programa, ela está lá como metáfora de um recorte real que utiliza os conceitos filosóficos de Confúcio como fio condutor.

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Confúcio: ideais sobre como os indivíduos devem se comportar para que haja harmonia na vida comum e na sociedade

Os personagens se vêem às voltas com situações de grande sacrifício, altruísmo e despojamento, bem como ganância, cobiça e mesquinhez que fazem alguns personagens serem piores que os monstros da série, de tão mesquinhos que são ao explorar o povo e enriquecer às suas custas, não medindo esforços para se manterem no poder.

Essas relações são o ponto alto em Kingdom que fornece uma visão de mundo semelhante ao real e aborda temas sensíveis para reflexão, tais como pobreza, fome, guerra, sofrimento e morte.

Segundo Confúcio, o líder da nação que não possui boa qualidade de vida (Ren), virtuoso e altruísta, não está apto a governar e seus súditos dificilmente agirão da mesma maneira.

O que fazer, então, quando o Estado está totalmente à mercê dos desígnios maniqueístas dos seus governantes e mentiras são forjadas a todo instante no intuito de que o poder seja mantido a qualquer custo?

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Os ideais confucionistas permeiam a série Kingdom, em que personagens que possuem o Ren (humanidade) defendem valores altruístas mesmo em meio a guerra

Sam questões que, ao serem colocadas em discussão, fazem com que a realidade e a ficção se entrelacem e forneçam analogias que caem feito uma luva nesses dias modernos em que a falta de empatia, horror e crueldade são a pauta.

Ação, drama… e zumbis!

Com duas temporadas bem amarradas, ritmo frenético e boa contextualização política ambientada durante o período feudal, Kingdom trouxe um novo fôlego para o gênero terror.

A tal praga zumbi que acomete a população de Joseon, transformando-os em monstros enlouquecidos sedentos por carne e sangue, cumpre seu papel satisfatoriamente.

Kingdom (01)

Kingdom oferece uma visão singular do gênero zumbi num recorte social e político relevante

Um gênero tão desgastado como o da vertente zumbi, Kingdom surge como uma lufada criativa que, mesmo não inovando, investe parte da produção em visualidades incríveis como as locações idílicas e misteriosas que transmitem beleza e tensão ao mesmo tempo.

Kingdom cumpre o papel de divertir e criar arrepios no espectador, alerta a qualquer movimento estranho em seus doze episódios (seis para cada temporada).

E deixa um bom cliffhanger no final para os fãs que torcem por uma terceira temporada. Enquanto ela não vem, o espectador pode assistir ao episódio especial que trata de outras questões que não foram aprofundadas na série.

Assista Kingdom, maratone os episódios e seja impactado pelo drama de época e zumbis mais interessante que já surgiu nos últimos anos – uma jornada épica cheia de desafios.

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Ultimato do Bacon

Avaliação: Ótimo!


Créditos:
Texto: André ‘Brasuka” Roberto – @Comunicafic
Imagens: Reprodução
Edição: Diego Brisse
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